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POR QUE NÓS DORMIMOS

  • Foto do escritor: Angelo Salignac
    Angelo Salignac
  • 4 de jul. de 2021
  • 3 min de leitura

Livro de Mathew Walker, INTRÍNSECA, 2018, ISBN 978-85-510-0365-7.


Logo após dar à luz, uma hipotética mãe recebe a visita do Pediatra, que avisa: “Parabéns! É um menino saudável, fizemos todos os testes preliminares e parece que está tudo bem. Só tem uma coisa: de agora em diante e pelo resto da vida de seu filho, ele repetidamente e rotineiramente cairá em um estado de coma aparente, que às vezes será muito semelhante à morte. Enquanto seu corpinho permanece quieto, sua mente frequentemente se encherá de alucinações bizarras e estonteantes. Esse estado consumirá um terço de sua vida e eu não tenho absolutamente nenhuma ideia de porque ele fará isso, ou para que serve. Boa sorte!”.


Esse é um pequeno trecho de um livro de divulgação científica realmente interessante, principalmente para quem vê o sono como apenas uma oportunidade de descansar – acredite, isso está longe da verdadeira dimensão dessa tão desconhecida faceta da nossa vida.


Seu principal argumento sobre o desafio de saúde pública em que o dormir se tornou é que todos nós precisamos de pelo menos sete, e de preferência oito, horas de sono por noite: isso é vital para muitas funções do cérebro e do corpo, incluindo memória, resolução de problemas, atenção, a função imunológica, o crescimento e o funcionamento eficaz e eficiente da maioria dos nossos órgãos. A falta de sono leva à demência, aumento da pressão arterial, doenças cardíacas, derrame, câncer, problemas no trânsito e outros acidentes, aumenta a propensão a infecções, em suma: todas as causas mais comuns de morbidade e mortalidade.

Mesmo assim, muitas pessoas no mundo desenvolvido não dormem o período ideal de horas por noite e não conseguem recuperar o sono perdido, pois dormir até tarde no fim de semana não desfaz o estrago causado durante os cinco dias anteriores. Temos uma cultura que estigmatiza o dormir como fraqueza ou preguiça, e admiramos pessoas como Margaret Thatcher e Ronald Reagan (ambos sucumbiram à demência), que supostamente dormiam apenas quatro ou cinco horas todos os dias - dormir tão pouco sem sofrer danos gravíssimos no longo prazo é extremamente raro.

Os humanos evoluíram ao longo de quase três milhões de anos para dormir oito horas por noite. Walker apresenta evidências de que caçadores-coletores dormem essa quantidade de horas, embora frequentemente em duas etapas. O sono é claramente importante, extraordinário e indisfarçadamente envolto em mistério.


Por que dormimos? Afinal, quando se está dormindo (e todos os animais dormem), você não pode caçar, coletar frutas, comer, reproduzir ou se defender. No entanto, Walker conclui que as vantagens evolutivas do sono são muito maiores do que suas desvantagens. Em outras palavras, o sono aumenta muito nossa aptidão evolutiva, de maneiras que ainda não conseguimos entender completamente.


Poucos descreveriam o sono como um pilar da boa saúde, mas o autor vai além: “Eu costumava dizer que o sono é o terceiro pilar da boa saúde, ao lado da dieta e dos exercícios, mas mudei de opinião: o sono é mais do que um pilar; é a base sobre a qual se assentam os outros dois bastiões da saúde. Diminua ou prejudique apenas um pouco o seu sono, e uma alimentação cuidadosa ou exercícios físicos tornam-se menos do que eficazes”. Para o autor, “a diminuição do sono em todas as nações industrializadas está tendo um impacto catastrófico”.


Nem todas as afirmações de Walker são necessariamente verdadeiras: a forte ligação que ele afirma existir entre não dormir o suficiente e desenvolver a doença de Alzheimer ainda não é algo claramente determinado. Em um esforço para nos despertar para o mal de dormir pouco, ele às vezes relata como fato o que a ciência ainda não demonstrou claramente. Mesmo assim, o livro é mais que importante: é fascinante.


Algumas dicas para favorecer o sono são desconhecidas ou ignoradas pela maioria dos insones... Outras, como por exemplo essa, são conhecidas pelo senso comum: se você tem ar-condicionado, tente fazer com que a temperatura do ambiente esteja por volta de 18 graus na hora em que pretende dormir. Lembra que temperaturas amenas parecem favorecer o sono? Pois é...


Walker também menciona as inúmeras violências que cometemos contra as nossas necessidades de dormir. Critica os sistemas escolares que obrigam os adolescentes a começar as aulas às sete da manhã, por não compreenderem que o ritmo diurno dos adolescentes está cerca de três horas atrás do dos adultos, o que significa que, para os jovens, acordar às seis horas todos os dias para chegar à escola às sete é como se um adulto tivesse de sair da cama todos os dias às três da manhã!


Temos muito a aprender sobre coisas óbvias, tão próximas de nós que não conseguimos enxergar sua importância. Descuidar do sono é o caminho certo para uma série de problemas que não demoram a acontecer, e que são discutidos de maneira abrangente e agradável neste livro.


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©2021, por Angelo Salignac.

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